"As primeiras publicações abordando o tema começaram no início dos anos 80, embora não se
trate de um fenómeno novo. Hirigoyen (2002), escritora francesa que é uma das pioneiras no
desenvolvimento de pesquisas sobre assédio moral, destaca que é recente a identificação deste fenómeno como destruidor do ambiente de trabalho, não somente diminuindo a produtividade dos profissionais, como também favorecendo o absentismo, podendo trazer danos à personalidade, dignidade ou à integridade física ou psíquica de um profissional. São, portanto, as consequências negativas do assédio moral, sejam aquelas referentes às organizações, sejam aquelas que se referem às consequências para a vida e carreira profissional, que mobilizam as publicações e estudos sobre este fenómeno.
Hirigoyen (2002), define-o como “a violência perversa no quotidiano”. Segundo esta autora, um processo perverso pode, ocasionalmente, ser utilizado por todas as pessoas, tornando-se destrutivo apenas quando utilizado com frequência e repetição no tempo.
Ao tratar sobre o assédio moral como a violência perversa no quotidiano, esta autora aborda a
violência privada: violência perversa entre casais e violência perversa nas famílias e o assédio
na empresa.
Freitas (2001) sinaliza que o assédio moral começa, na maioria das vezes, pelo abuso de um
poder, segue por um abuso narcísico no qual o outro perde a auto-estima, podendo chegar, em algumas circunstâncias, ao abuso sexual. Uma leve mentira ou uma falta de respeito flagrante pode ser o início de um processo de manipulação por parte de um indivíduo perverso, que tende a reproduzir este comportamento destruidor em todas as circunstâncias de sua vida, como por exemplo: local de trabalho e vida familiar, de entre outros.
Na Língua Portuguesa, segundo Ferreira (1986), assediar significa perseguir com insistência
ou ainda importunar, molestar, com perguntas ou pretensões insistentes. Segundo este autor,
moral refere-se a costumes, é um conjunto de regras de conduta consideradas válidas para
qualquer tempo ou lugar, seja para um grupo ou uma pessoa determinada.
Segundo Hirigoyen (2002), os estudiosos do tema assédio moral não conseguiram ainda
chegar a um denominador comum sobre uma definição suficientemente pertinente, pois esse
fenómeno pode ser abordado de diferentes maneiras de acordo com o ponto de vista que for
adoptado. Médicos, sociólogos e juristas, de entre outros, tratam o fenómeno do assédio moral em conformidade com seu foco de visão e actuação.
Nas definições de assédio moral que foram apresentadas, pode-se observar que o fenómeno
envolve comportamentos destruidores, agressivos, violentos, manipuladores e de perseguição
por parte do “assediador”, que ocorrem de maneira intencional e frequente em diversas
esferas da vida quotidiana (incluindo o lar e o trabalho). As consequências do assédio moral,
que envolve relações de poder e dominação entre quem assedia e quem é assediado, são
também destacadas, tanto na esfera empresarial (absentismo, baixa produtividade) quanto
para os trabalhadores, com implicações físicas e psíquicas.
Uma abordagem que reúna diferentes visões e enfoques a respeito do assédio moral é
importante para que este fenómeno possa ser melhor compreendido.
O Assédio Moral no Ambiente de Trabalho
O assédio moral no ambiente de trabalho tem mobilizado sindicatos, médicos do trabalho,
pesquisadores, profissionais da área de direito, os próprios trabalhadores e as empresas a se
interessarem pela compreensão deste fenómeno e a análise de suas causas e consequências
(Hirigoyen, 2002; Aguiar, 2003).
Freitas (2001) destaca que o assédio moral nas organizações nasce, geralmente, de forma
insignificante e propaga-se pelo facto de que as pessoas envolvidas não querem formalizar a
denúncia, encarando as situações de maneira superficial. A empresa pode fragilizar os
indivíduos para atingir os próprios objetivos, sendo complacente com certos abusos de poder,
em detrimento de um processo económico competitivo no qual está inserida (CORRÊA E
CARRIERI, 2007).
Por assédio no local de trabalho, Hirigoyen (2002, p. 65) entende
toda a conduta abusiva, manifestando-se sobretudo por comportamentos, palavras,
actos, gestos, escritos que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à
integridade física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo o seu emprego ou
degradar o ambiente de trabalho.
Muito embora a agressão por parte dos superiores hierárquicos seja observada como
demasiado frequente no contexto actual, Hirigoyen (2002) destaca também que o assédio ou a
agressão podem ser desencadeados entre colegas ou ainda partindo do subordinado para o
superior.
Tão importante quanto a possibilidade de entender ou qualificar o assédio moral no ambiente
de trabalho é a compreensão daquilo que não é assédio moral. Nem todas as pessoas que se
dizem assediadas o são de facto, por isso é preciso cautela.
Segundo Hirigoyen (2002), não podemos considerar como assédio moral no ambiente de
trabalho: situações de stressantes ou o stress gerado por situações de conflito, conflitos
explicitados, gestão despótica, agressões pontuais, más condições de trabalho ou ainda
imposições profissionais.
Freitas (2001) chama a atenção para o facto de que os conflitos que os grupos vivem no
ambiente de trabalho e que fazem parte deste universo não caracterizam, necessariamente,
assédio. “É a repetição das situações que vexam o outro e das humilhações sem nenhuma
nuance que constitui o fenómeno destruidor” (Freitas, 2001, p. 10,). Seguindo
este mesmo raciocínio, Hirigoyen (2002, p. 30) também pontua que “o assédio moral
caracteriza-se antes de tudo pela repetição”, destacando que as atitudes, palavras e
comportamentos que configuram uma situação de assédio moral podem parecer inofensivos se
tomados separadamente. De acordo com Leymann (1996), o foco não deve ser apenas o quê
ou como aconteceu a situação conflituosa, mas sua frequência e duração.
“Engolir sapos” no Ambiente de Trabalho
Na linguagem quotidiana, é comum o uso da expressão “engolir sapos” para se referir a
situações nas quais uma pessoa deve agir ou pensar de maneira diferente ou divergente
daquela que praticaria sem a existência de alguma influência externa. “Engolir sapos” faz
parte da vida, fora e dentro do ambiente de trabalho. Segundo Barelli (2004), engolir sapos é
uma metáfora utilizada para explicar aqueles problemas que não conseguimos resolver e a
expressão “engolir sapos” vem dos antigos romanos, que muitas vezes sentiam-se
contrariados frente às ordens de César.
Serra (2004) salienta que engolir sapos é não ter o direito, o espaço, a liberdade ou a coragem
de responder à altura a um insulto, uma humilhação, uma acusação, uma ironia e que sapos são
comuns em organizações que adoptam um modelo de gestão autoritário e insensível.
Ao abordar aspectos de violência pertinentes ao ambiente de trabalho, Iasbeck (2004)
descreve uma série de situações de entre as quais o processo de “engolir sapos” é também
destacado:
Quem não foi vítima de uma caso de injustiça no ambiente de trabalho? Quem
nunca se indignou ao ser levado a trair, denunciar ou prejudicar outros para manter a sua posição ou obter maiores ganhos no trabalho? Quem nunca teve de engolir
“sapos”, presenciar calado injustiças de toda ordem e sublevar deslealdades para não
ser prejudicado por um chefe, gerente ou supervisor de trabalho? Quantos se
acobardam diante de uma ameaça velada ou explícita de perder a sua posição e seu
salário? (...) Quem nunca se sentiu aviltado ao ter de “esquecer” desonestidades e
demais atrocidades morais cometidas no ambiente de trabalho? (Iasbeck, 2004, p. 2)
Pode-se dizer que “engolir sapos” no Brasil, tem as suas raízes nos séculos coloniais. Santos
(2000), expõe que o autoritarismo é um traço da cultura brasileira, e que a “síndrome”
autoritária está associada a posturas “passivas” perante a vida quotidiana e as decisões de cunho moral e político que se apresentam ao longo de cada biografia individual. Esta “passividade” teria, segundo este autor, sido cunhada no desenvolvimento da cultura religiosa brasileira, caracterizada pela fragmentação, oriunda da subordinação da vida social e política à vida económica."
“Engolir sapos” no Ambiente de Trabalho:
Uma Análise do Fenómeno do Assédio Moral no Quotidiano Profissional
Autoras: Míriam Rodrigues e Maria Luisa Mendes Teixeira
Universidade Presbiteriana Mackenzie – São Paulo - Brasil
1 comentário:
Pois eu não engulo sapos de forma alguma, digo oque tenho a dizer na altura.
As nossas organizações só têm a perder quando dão espaço para o assédio moral, e esta é uma realidade cada vez mais presente. Mas, se os indivíduos se respeitarem a si próprios e forem assertivos, os assediadores retraem-se.
Este fenómeno existe porque as lideranças são muito fracas. O que não falta são lideres impostos que nada sabem de liderança.
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