"Por assédio no local de trabalho é preciso entender toda e qualquer conduta abusiva que se manifesta especialmente por comportamentos, palavras, actos, gestos, escritos, que possam atingir a personalidade, a dignidade ou a integridade física ou psicológica de uma pessoa, pôr em perigo o emprego desta ou degradar o clima de trabalho.
Se bem que o assédio no trabalho seja tão velho como o próprio trabalho, foi só no princípio desta década que ele foi verdadeiramente identificado como um fenómeno que destrói o ambiente no trabalho, que diminui a produtividade, mas que favorece também o absentismo pelos desgastes psicológicos que arrasta consigo.
Este fenómeno foi estudado essencialmente nos países anglo-saxónicos e nos países nórdicos, onde foi qualificado de mobbing - de mob: multidão, matilha, plebe, daí a ideia de importunar.
Heinz Leymann (Mobbing; tradução francesa, Paris, 1996.), investigador em psicologia do trabalho exercendo na Suécia, tem investigado junto de diferentes grupos profissionais, há uma dezena de anos, este processo que qualificou de "psicoterror".
Agora, em numerosos países, os sindicatos, os médicos do trabalho, as caixas de segurança por doença começam a interessar-se pelo fenómeno.
Em França, nestes últimos anos, nas empresas como nos media, tem-se encarado sobretudo o assédio sexual, o único tido em conta pela legislação francesa, o qual, no entanto, não é mais do que um aspecto do assédio no sentido lato.
Esta guerra psicológica no local de trabalho encerra dois fenómenos:
- o abuso de poder, que é logo desmascarado e não forçosamente aceite pelos assalariados,
- a manipulação perversa, mais insidiosa a pôr-se em acção e que faz ainda mais estragos.
O assédio nasce de maneira anódina e propaga-se insidiosamente.
Num primeiro tempo, as pessoas atingidas não querem ofender-se e consideram sem importância remoques e vexames.
Depois, esses ataques multiplicam-se e a vítima é regularmente encurralada, inferiorizada, submetida a manobras hostis e degradantes durante um longo período.
De todas essas agressões, a pessoa não morre directamente, mas perde uma parte de si mesma.
Volta ao fim de cada dia, usada, humilhada, estragada. É-lhe difícil recompor-se.
(...)
Quando o assédio aparece é como uma máquina que se põe a trabalhar e que tudo pode triturar.
Trata-se de um fenómeno aterrador porque inumano, sem estados de alma e sem piedade.
Os colegas à roda, por cobardia, egoísmo ou medo, preferem manter-se à distância.
Quando este tipo de interacção assimétrica e destruidora está em campo, não fará mais do que ampliar-se se uma pessoa exterior não intervir energicamente.
Com efeito, num momento de crise, tem-se tendência para acentuar o registo em que se está: uma empresa rígida torna-se ainda mais rígida, um empregado deprimido torna-se ainda mais deprimido, um agressor ainda mais agressivo, etc.
Acentua-se o que se é.
(...)
Trata-se de um fenómeno circular. De nada serve então procurar quem está na origem do conflito.
(...)
Uma sequência de comportamentos deliberados da parte do agressor destina-se a desencadear a ansiedade da vítima, o que provoca nela uma atitude defensiva, ela própria geradora de novas agressões.
Após um certo tempo de evolução do conflito, manifestam-se fenómenos de fobia recíproca: a visão do perseguidor desencadeia na vítima um fenómeno de medo.
É um reflexo condicionado ofensivo ou defensivo.
O medo leva a vítima a comportamentos patológicos que servirão de álibis para justificar retroactivamente a agressão.
Ela reage a maior parte das vezes de uma maneira veemente e confusa.
Empreenda ela o que empreender, faça o que fizer, tudo é voltado contra ela pelos perseguidores.
A finalidade da manobra é fazê-la perder as estribeiras, empurrá-la para a confusão total e para a culpa.
Mesmo que o assédio seja horizontal (um colega agride um outro colega), a hierarquia não intervém.
Ela recusa ver ou deixa andar."
In Assédio, Coacção e Violência no Quotidiano
Marie-France Hirigoyen
Marie-France Hirigoyen